Jô Soares - O Astronauta sem regime

Particularmente só gostei mesmo de um livro de um Jô Soares: O Xangô de Baker Street. Talvez por conhecer previamente Sherlock Holmes e pelo mesmo investigar crimes no Brasil. Do livro do assassinato de Getúlio eu só lembro do rapaz que o matou (e protagonista, portanto não é spoiler): Dimitri Borja Korosec (eu não googlei, juro). Do outro livro, Assassinatos na Academia Brasileira de Letras, não lembro de nada. Nada.

Eis que estava de BOBEIRA passeando pela centro da cidade e encontrei este livro de Jô Soares em um dos sebos. Achei que fosse uma historinha mesmo, com começo, meio e fim. E que envolvesse algum assassinato, porque esse é o tema recorrente em todos os outros livros do Jô (ele não sabe falar de outra coisa?). Livros em sebos, em geral, são tão baratos que só fiz questão de verificar se o livro estava em bom estado, folheando rapidamente as páginas. Sim, comprei pela capa. Pelo autor. Nem olhei a ORELHA (do livro).


Até então nunca tinha ouvido falar do livro. Ao chegar em casa e começar a ler a parte técnica (editora, capa, ano, etc), a surpresa: 1983. Pelo que pesquisei, este é o primeiro livro produzido somente por Jô Soares (sem nenhuma co-autoria, diferente de "A Copa Que Ninguém Viu e a Que Não Queremos Lembrar" e "Humor Nos Tempos do Collor"). E não é uma historinha como pensava, mas sim crônicas. Diversas crônicas. 43 mais especificamente. Sabe de quantas eu gostei? Talvez, no máximo, 10. De verdade mesmo só gostei de 2, os quais transcrevi uns trechos abaixo. 

A guerra.

(...) eram apenas estes os requisitos para uma boa guerra:
1. Um inimigo — Sem um inimigo, dificilmente se fará uma boa guerra. As pessoas vão acabar simpatizando entre si sem atacar ninguém. A não ser que se trate de uma guerra civil, em que as pessoas, sem a menor cerimônia, se matam na sua própria língua.
2. Raiva — Com raiva a guerra é feita muito mais facilmente, já que quem ganha a guerra é quem liquida o maior número possível de inimigos. Um dos dois lados em guerra sempre ganha e outro sempre perde. É praticamente impossível empatar uma guerra.
3. Armas — Sem elas as guerras não passam de vulgares escaramuças. De preferência, as partes interessadas na luta devem usar armas do mesmo porte. Ex.: canhão contra canhão, canivete contra canivete. Nunca usar canivete contra canhão, senão a guerra acaba logo.
4. Espiões — Perfeitos para aumentar o período de duração das guerras. Devem sempre fornecer informações de um inimigo para o outro. Já que dificilmente estas informações serão corretas, os conflitos ficarão por isso mesmo mais conflitados.
5. Roupa — Ultimo e mais importante requisito de todos. Sem roupas, as pessoas teriam que guerrear nuas, o que seria imediatamente considerado imoral, ficando a guerra proibida. (...)

O noticiário impossível que o árbitro de futebol sonhou.

Anulou com razão

Assim que o árbitro apitou anulando o gol que daria o campeonato ao Ceará, o centroavante autor do tento aproximou-se de Sua Senhoria e, ajoelhando-se com respeito, beijou-lhe a mão, enquanto dizia: "Talvez eu não estivesse impedido, mas tenho confiança no seu golpe de vista. Obrigado por ter me corrigido". Depois do jogo, a diretoria do clube que perdeu ofereceu um jantar regado a champanha, gesto que o simpático referee considerou esportivo.

Surpresa faz o árbitro chorar

As lágrimas rolaram pela face do árbitro quando ele foi surpreendido pelo carinho que toda a torcida demonstrou depois do prélio entre Vasco e Flamengo, que terminou empatado graças às suas sábias decisões e alijando inclusive os dois times do certame. Todos sem exceção, jogadores, diretores técnicos e torcidas, pediram que Sua Senhoria fizesse a volta olímpica, en-quanto cantavam em coro o Parabéns para você, numa singela homenagem ao Dia das Mães.
"O Astronauta sem regime" possui pouco mais de 100 páginas. Tive a impressão de que as crônicas foram jogadas no livro sem uma seleção mais qualificada. Talvez se ele fosse menor, com algumas das histórias sendo mais elaboradas, o resultado fosse melhor. Não valeu muito a pena ler, mas essa crônica do arbitro de futebol me lembrou bastante do seriado brasileiro FDP feito pela HBO Brasil

P.S.: Uma grande coincidência (futebolística) é que dentro do livro havia esse papel abaixo. É uma tabela da copa do mundo de 1986, realizada no México. Tudo a ver com futebol e com o seriado que mencionei anteriormente.

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